3 de out. de 2007

Um Brinde

Observava-a de longe, do outro lado do recinto. Não sabia o por quê de fazer aquilo, mas sabia que a sensação o agradava.
Ele não estava lá, vendo a mão esquerda agraciar-se como apoio para o queixo; como a outra segurava a pena e risacava sem pressa o pergaminho, e, principalmente, o modo como os olhos escorregavam pelas folhas do livro e depois checavam as anotações.
Só ele a vi agora.
No começo, olhava debaixo, as íris presas no topo dos olhos, para ser discreto. Mas de quê adiantava vir a ser discreto se ela jamais tiraria as órbitas castanhas do livro?! Não. Ela nunca o viria ali. Teria atenção para o livro - unicamente para ele.
Um ato involuntário ele sentiu. Sentia pressão entre os dentes. Por que os livros e não ele? O que teriam eles de mais interessante do que a sua singular beleza?! Não descobriria. Não podia. Amassou entre os dedos o pergaminho. Ficou parado, imóvel - nem mesmo tinha certeza se respirava. Os olhos fixos nela, nos movimentos delicados que fazia e no pequeno sorriso que lançava àquele maldito monte de páginas.
Um ato inesperado. O coração saltou. A mão soltou o papel. Imóvel estava, mas por espanto.
O castanho pousou-se sobre ele, antecedido por um pequeno movimento da cabeça. Ela olhava-o e sorria levemente. Não havia dentes expostos e nem lábios separados. Estavam unidos, num risco, mas ainda um sorriso à ele.
Sentiu-se um romântico estúpido que sente os ânimos mudarem com um breve aceno de cabeça da amada. Entretanto, ele estava longe de ser um.
Não podia tocá-la, não podia beijá-la - mas nada o impedia de cortejá-la.
Amizade ou Necessidade?!
No momento, brindava à necessidade - e sorriu de volta, abertamente, galante como era.

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